No meu aniversário de 26 anos ganhei um presente. A minha
boneca preferida da infância, esquecida no fundo de algum baú, foi resgatada
em silêncio. Recebeu cuidados no hospital, ganhou nova roupa e sobrevida.
Voltou para casa embalada para presente, feito coisa inédita. Quando abri, além
da surpresa do reencontro, a boneca ainda fazia o mesmo gesto encantado que já
não sabia fazer há tempos: ninar o bebê. O presente foi, sem dúvida, mais
surpreendente do que qualquer coisa nova. Talvez por ter sido elaborado com
açúcar e com afeto, como canta a música.
Além dos presentes elaborados, há também os que acontecem sem aviso.
Hoje, quando estava chegando em casa, distraída e já quase entrando pela porta,
o movimento das folhas me fizeram olhar para o coqueiro. Lá em cima, coloridos,
estavam os três tucanos em postura silenciosa e altiva. Talvez aquela fosse uma
postura de alerta por causa do barulho que fiz ao bater o portão. Quando eles
resolveram voar, mais uma surpresa: eram quatro e não os três que estavam mais
perto da vista. O dia ganhou inspiração.
Tarde dessas a professora de música contava sobre a conversa que teve
com o pai de uma aluna. O pai estava empenhado em incentivar o desejo de suas
filhas pela música e pedia dicas sobre brinquedos que poderia comprar para
presenteá-las. A professora indicou uma coisa inesperada: economizar presentes.
Contou para ele que não teria objeto que significasse mais para as
crianças do que ele passar alguns momentos ouvindo música em conjunto, cantando
com elas ou escutandoas tocar. Com isso, segredou para o pai que ele próprio,
inventando alguns momentos musicais em família, seria o presente mais querido das
filhas! O pai foi para casa feliz.
Entender os mistérios dos presentes pode ser mesmo uma arte. Povos
antigos viam na sinceridade e na confiança os melhores presentes, e estudiosos
acreditam que a reciprocidade era um dos valores que cercava o presentear.
A preocupação em retribuir a hospitalidade era muito forte entre povos
vizinhos. Eles recebiam visitantes, oferecendo o que tinham de melhor e, mais
tarde, fariam também uma visita, sendo recebidos com o mesmo empenho.
Quando a professora falava na economia do presente, talvez ela também
estivesse falando nesse equilíbrio e bom senso que os povos antigos bem
conheciam. De volta ao jardim, esbarrei outro dia a cabeça em um galho. Olhei para
cima e: presente! O galho estava cheio de pitangas maduras.
Em uma época em que há tanto disponível nas prateleiras, pode parecer desnecessário criar algo com as mãos. Esse labor, no entanto, vai ao encontro de uma necessidade mais profunda: a reconexão com processos que se ligam à essência da própria vida. Mais do que o resultado material das atividades, o que importa é a transformação vivenciada no interior do próprio ser humano.
“Os pais terrenos oferecem proteção e ajuda para a época que o espírito necessita, a fim de conduzir de maneira plena e autorresponsável seu novo corpo terreno; depois, porém...”